sábado, 7 de setembro de 2013

'Fotografia são símbolos', diz Sebastião Salgado

"Gênesis" - um livro de sucesso e uma exposição- acontece simultaneamente em vários países, inclusive no Brasil.

O Fantástico mostrou a beleza das imagens de um dos maiores fotógrafos do mundo, o brasileiro Sebastião Salgado.
O Sebastião, ou "Tião", para os íntimos,  conta a história do início do mundo nas fotos do livro e da exposição "Gênesis", um trabalho primoroso que você precisa conhecer.
Zeca Camargo: Final de tarde em Paris quer lugar e motivo melhor pra gente celebrar o Show da Vida? Vamos melhorar um pouco essa celebração. Vamos convidar alguém que foi atrás do início desse show inteiro, do Gênese. A gente tá perto do seu estúdio, Sebastião?
Sebastião Salgado: Tá ao lado.
Zeca Camargo: Então por favor.
Sebastião Salgado: Fotografia são símbolos. Ou você tem uma fotografia que ela sozinha conta a história sem legenda, sem nada, ou você não tem a fotografia.

Circular pelo estúdio de Sebastião é como dar uma mini volta ao mundo. É daqui que saem as imagens que fizeram dele um dos mais respeitados fotógrafos internacionalmente - uma reputação que só cresceu com seu último trabalho, "Gênesis" - um livro de sucesso e uma exposição que acontece simultaneamente em vários países, inclusive no Brasil. A mostra agora está no Rio e, mês que vem, vai para São Paulo.

Zeca Camargo: Todos os destinos que você foi você tinha uma. no mínimo uma ideia. Muito difícil escolher esses lugares, ou você. Você partiu da Terra inteira, né? Da História inteira, né?
Sebastião Salgado: Olha, eu parti da Terra inteira. Agora, pra mim, eu tive que fazer um aprendizado em tudo pra fazer o "Gênesis". Primeiro: eu nunca tinha fotografado outra coisa que o ser humano. O único animal que eu tinha fotografado até então era o ser humano. Eu tive que aprender a fotografar os outros animais, aprender a fotografar paisagens.

E como aprendeu: a ideia em "Gênesis" era mostrar a terra como ela era - e ainda é - no tempo em que nós começamos a tomar conta dela. Um passado (e ao mesmo tempo presente), que está registrado com uma força impressionante. Sebastião descobriu que a nossa casa não mudou tanto assim:

Sebastião Salgado: Quase a metade do planeta ainda tá como no dia do Gênesis.
Zeca Camargo: Isso é incrível.
Sebastião Salgado: Nós temos um pouco mais de 46 por cento do planeta que o homem foi, passou, mas não destruiu ainda. As terras muito frias do planeta ou as terras extremamente quentes, como o deserto.
E tem outra coisa que Sebastião percebeu que não mudou. Nós mesmos
Sebastião Salgado: Eu descobri que nós, de dez mil anos atrás, há 50 mil anos atrás, que eu encontrei na viagem de "Gênesis", tem pouquissíma diferença com nós de hoje. Porque as coisas essenciais nós já tínhamos. Olha, a gente já se amava uns aos outros, a gente amava os filhos da gente como a gente ama hoje. O conceito de comunidade, o conceito de solidariedade, tudo existia, entende? 
Nesse sentido, "Gênesis" é uma espécie de resumo maior de tudo que Sebastião Salgado sempre buscou

Sebastião Salgado: O que eu acreditei, você entende? Foi como eu vivi com a minha família, com meus filhos, com a minha mulher, com meus amigos, com a minha ideologia, com a minha ética, com tudo. Olha, veja a minha geração. Eu tenho 70 anos, eu vim de uma geração que lutou por uma série de direitos, que lutou contra a ditadura, que teve que sair de seu país, que fiz parte de um movimento de esquerda, que lutou pela libertação de muita coisa na África, em Portugal, no Brasil, nos outros países da América Latina, então eu venho desse comportamento. Então eu só fotografei o que eu quis fotografar, o que eu tive prazer de fotografar. Mesmo que fossem histórias muito duras, eu queria fazer. Eu queria exorcizar alguma coisa dentro de mim,  então eu fui.    
Mas sem esquecer o lugar onde tudo começou.
Sebastião Salgado: Eu cresci numa fazenda, eu vivi numa liberdade fantástica, naquele relevo mineiro que não são montanhas altas, mas são montanhas. Então com aquela sucessão de montanhas, os pontos altos da fazenda do meu pai, o sonho que eu tinha de ir mais longe, aquelas luzes. Olha, eu reencontrei aquelas luzes em quase todas as minhas fotografias.
Foi pra sentir um pouco dessa luz, dessa inspiração, que o Fantástico foi até Aimorés, em Minas Gerais. Lá Sebastião Salgado voltou depois de anos pra fazer um belíssimo trabalho de recuperação da natureza. E para reencontrar amigos que conhecem ele apenas por "Tião".

Zeca Camargo: Pra você, Sebastião Salgado não existe, né?
Marilda Damasceno, supervisora de logística: Não.
Zeca Camargo: E quem que é?
Marilda Damasceno, supervisora de logística: Tião.
Faz 13 anos que Marilda trabalha para o Tião no Instituto Terra, que recupera a Mata Atlântica na região da fazenda que era família dele.
Zeca Camargo: Cada lugar que ele vai, ele tem uma história pra contar pra gente, né?
“Eu fiquei. dormi na rede, dormi num barraca". Eu falei: Tião, pra que isso? Você é um cara já, assim, de idade. Ele fala: ‘Marildinha, faz parte, eu gosto disso’.

Manoel Bernardo Lopes, funcionário da fazenda: Conheço o Tião desde novo.
Zeca Camargo: Criança mesmo?
Manoel Bernardo Lopes, funcionário da fazenda: Bem assim de nove anos, mais ou menos. Ele é apaixonado por esse terreno desde criança.
Seu Manoel começou a trabalhar aqui como vaqueiro, mas hoje faz parte dessa equipe que está devolvendo o verde à região - e fazendo escola.
Manoel Bernardo Lopes, funcionário da fazenda: É uma coisa muito bem feita. Muita linda. E ele faz com muito entusiasmo. O que o Tião faz, faz com perfeição. Seja qualquer parte que ele tiver, ele. ele é agarrado ali e é com garra mesmo, com força, com entusiasmo, com muito amor, com muita atenção com todo mundo.

E o Tião de Aimorés é o Sebastião do mundo: esse brasileiro que, se deixar não vai para nunca de chamar a atenção do próprio homem para o show da vida.

Zeca Camargo: Depois que você foi à origem nossa ali, você caminha pra onde no seu trabalho?
Sebastião Salgado: Não, olha. Os fotógrafos têm uma vantagem imensa, sabe? Os fotógrafos vivem muito, certamente, e trabalham a vida inteira. É que nem bicicleta. Se parar de pedalar, a gente cai.
Fonte: G1 Globo

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