Entre as ações para o setor na década de 1990 foram criados o centro cultural e o Instituto Dragão do Mar
Fachada do Dragão do Mar, em 2002 (foto maior) e evento de pré-inauguração, em 1998 (foto menor)
A época era de retomada da produção cinematográfica nacional, após a crise do início dos anos 1990. No Ceará, os objetivos não eram nenhum pouco modestos: transformar o Estado um polo nacional de produção de cinema e audiovisual, além de projetar o material dos realizadores locais em cenários transnacionais.
O dia 7 de agosto de 1996 foi simbólico para o nosso audiovisual. Na data, foi lançado o Polo de Audiovisual do Ceará, uma parceria com o Governo Federal, na tentativa de descentralizar a produção do País, contando com R$ 5 milhões do Ministério da Indústria e Comércio. No mesmo dia, foi reinaugurado o Museu da Imagem do Som (MIS), criado em 1980 e fechado cinco anos depois.
O secretário da Cultura na gestão do governador o Governo Ciro Gomes era o sociólogo Paulo Linhares (atual presidente do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura). Ele comemorava o momento e centrava suas ações na consolidação de projetos recém-criados, como o Bureau de Cinema e a Lei Jereissati de Incentivo à Cultura; e a concepção de dois "dragões" que seriam a base de toda a política cultural: o Instituto Dragão do Mar de Arte e Indústria Audiovisual do Ceará - escola de múltiplas artes lançadas no mês anterior, com previsão de iniciar as atividades em agosto, oferecendo inicialmente 156 cursos voltado para a formação profissionais da cultura - artistas, técnicos e produtores; e o Centro Cultural Dragão do Mar - que capitalizaria a difusão de nossos bens culturais.
A "escola dialética", nas palavras de Linhares, era composta pelo Centro de Dramaturgia, Centro de Design e Centro de Estudos Básicos, ocupando inicialmente um Centro Artesanal na Av. Santos Dummont, o Centro Cultural do Palácio da Abolição, o Theatro José de Alencar e a Casa Amarela Eusélio Oliveira. Em seguida, também no antigo prédio da TV Ceará.
"Eu e o Orlando Senna fomos convidados para montar o Instituto. Era preciso começar do nada, nós não tínhamos espaço específico e nem condições técnicas de montar o projeto de uma hora para outra. O alicerce, então, foi o Centro de Dramaturgia, porque era mais simples e, ao mesmo tempo, de forma fundamental, a dramaturgia estava no epicentro de toda a formação. Era preciso criadores para textos de teatro, também roteiros para cinema", lembra o primeiro diretor do Instituto Dragão do Mar, o cineasta Maurice Capovilla.
A escola seguiu em meio a muitas críticas que iam do questionamento da escolha dos diretores, nomes de fora do Ceará, ao descrédito da necessidade do ainda em construção Centro Cultural, um "elefante branco".
Polo de Cinema
Em 1998, o projeto estava completo, contando ainda com a introdução do Curso de Dança, fechando os quatro pés da formação. Naquele ano, era notícia nos jornais a "nova geração do cinema cearense", que lançava localmente curtas-metragens documentais, ficções e animações. A produção contava com o apoio do Bureau de Cinema e da Lei Jereissati "Todo mundo estava fazendo cinema aqui. Média, longa, curta", ressalta Paulo Linhares.
Em entrevista concedida ao Diário do Nordeste em 1999, o sucessor de Linhares na pasta, o jornalista Nilton Almeida, revelou que em 1996 foram captados para o setor via Lei Jereissati R$1,206 milhões; em 1997, R$2,136 milhões; e em 1998, R$3,1 milhões. Na mesma entrevista, Almeida contabilizava 10,6 mil pessoas beneficiadas pelos cursos do Instituto Dragão do Mar.
"Nós criamos ainda a Film Comission, uma invenção americana que consiste em um Centro para organizar a produção cinematográfica, que trouxe mais ou menos 50 produções para filmar no Ceará. Essa foi start para ideia do Polo de Cinema. A ideia era trazer filmes para serem gravados aqui. Em contrapartida, essas produções teriam que contratar alunos do curso do cinema do Instituto. Era o início da profissionalização deles", completa Capovilla, sobre as ações em prática na época.
O tripé para a formação do Polo, detalha, era constituído por um centro de formação (Instituto), um centro de produção (Film Comission) e a difusão, representada pelo centro cultural e pelo Cine Ceará, que em 1995 foi ampliado, passando de mostra local para evento nacional. "Não deu certo. Mas o resultado se vê ainda hoje", avalia o ex-secretário.
Polêmica
Ao suceder Paulo Linhares (que havia deixado o cargo em 1998, já na gestão de Tasso Jereissati, para assumir vaga de Deputado Estadual) na Secretaria da Cultura, Nilton Almeida protagonizou uma das passagens mais polêmicas da história da escola.
Em agosto de 1998, foi inaugurado, em caráter experimental, o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (CDMAC), projeto que fecha o ciclo pensado anos antes para a cultura cearense, inaugurado oficialmente dia 28 de abril do ano seguinte. Também em 1999, Nilton demite os cineastas Maurice Capovilla e Orlando Senna das direções do Instituto e do Centro de Dramaturgia, respectivamente. "Devolvam nossas cabeças", clamavam os estudantes na época em protesto.
Manifestações por escrito de figuras importantes das artes nacional e internacionalmente, como o cineasta Walter Salles e os escritores Jorge Amado e Gabriel García Márquez, além de representantes da Escola de Cinema de Cuba, foram entregues ao secretário. "Eu encaminhei o abaixoassinado que recebi ao Tasso", conta Almeida.
Silas de Paula, então Chefe do Departamento de Comunicação Social e Biblioteconomia da Universidade Federal do Ceará (UFC), assumiu a direção do Instituto. A substituição, explica o ex-secretário, estava inserida em uma tentativa de formalização dos cursos do instituto. "O que eu fiz para tentar reduzir o problema? Criei uma diretoria de formação. Foi quando chamei o professor doutor Silas de Paula para coordenar. Já era uma forma de tentar abrir um processo de formalização dos cursos do Instituto", diz.
Mudanças
O Colégio de Dança e a Escola de Gastronomia foram algumas das ampliações ao projeto do instituto realizadas durante a gestão de Nilton Almeida. Além da direção do Instituto, detalha, foi feita uma reorientação das políticas para o audiovisual no Estado. "De 10 cineastas do Ceará que eu recebia, 11 faziam críticas veladas ao modelo que estava implantado. Então, como gestor, o natural era você ouvir os agentes, você avaliar e fazer correções", justifica.
Entre as mudanças, detalha, abandonou-se os projetos de investir pata atrair ou de financiar grandes produções em prol das filmes locais. "Uma grande produção vinha para o Ceará, com todas as facilidades, de recursos, de infraestrutura, e, porque é uma produção dentro dos padrões convencionais, tradicionais e comerciais, que acabavam não se enquadrando dentro da proposta do Instituto Dragão do Mar. O Estado virava apenas um palco de locação. Mas a participação dos alunos do instituto na produção, isso era fantasia", contesta Nilton Almeida.
Em 2000, foi lançado o Prêmio Ceará de Cinema e Vídeo, projeto sob a coordenação do Instituto Dragão do Mar que, no primeiro ano, apoiou oito produções, disponibilizando R$250 mil; e o dobro em 2001, sendo R$500 mil, distribuídos entre 16 projetos. "Eu não estou aqui condenando, porque eu fiz parte de todo esse processo. Os erros, se houve erros, foram de todos. Agora, você permanecer no erro não faz parte do meu modo de agir", encerra.
Fusão frustrada: a escola encerra as atividades
Foram quase sete anos completos em funcionamento. No dia 30 de janeiro de 2003, era anunciada pela nova gestão da Secretaria da Cultura do Ceará a fusão dos "dragões": o Instituto Dragão do Mar passava a integrar o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (CDMAC). A medida, argumentava à época a nova diretora, Cristiana Parente, visava alcançar melhores resultados e reduzir custos sem prejuízos para a formação do Instituto. Pelo contrário, seriam incorporados três novos núcleos, Música, Artes Plásticas e Literatura.
"A intenção de todo gestor publico é de tornar as ações menos burocráticas e mais eficazes. O CDMAC é importantíssimo e tem papel fundamental para a produção cultura do Ceará. Foi a primeira Organização Social de cultura do Brasil", argumenta a então Secretária Cláudia Leitão. O corte da verba repassada pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para a manutenção dos cursos, justifica, foi o que resultou na interrupção do projeto. "O CDMAC e toda a sua formação foi um divisor de águas na história de políticas culturais do Ceará. Aí há um mérito imenso na gestão do Paulo Linhares. Mas os recursos foram minguando. Estive na época com o (Ricardo) Berzoini, fomos brigar pelos cursos. E ele disse que esquecêssemos, que não haveria recurso", lamenta Cláudia.
Silas de Paula, último diretor do Instituto Dragão do Mar, contesta: "Dificuldades financeiras sempre existem em projetos de Arte e Cultura, pois dificilmente são considerados prioritários pelos governos. O Nilton Almeida sempre apoiou fortemente a luta por recursos para o Instituto e, assim, conseguíamos levar os projetos adiantes. A desculpa da fusão dada pela então Secretária, Cláudia Leitão, e pelo ex-governador Lúcio Alcântara foi uma tentativa de mascarar a decisão de fechar o Instituto".
Cristiana Parente permaneceu na direção do CDMAC apenas até julho de 2004, quando deixou o cargo, apontando como motivo da saída a fusão dos "dragões". "A fusão do centro cultural com o instituto ampliou nossas responsabilidades e não tivemos nenhum incremento na receita, muito pelo contrário", justificou, à época, em entrevista ao Diário do Nordeste. Dos cursos ofertados à época, apenas o Curso Técnico em Dança permaneceu e continua a ser oferecido pelo CDMAC.
FÁBIO MARQUESREPÓRTER
Fonte: Diário do Nordeste
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