sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Como criar a cultura de projetar o futuro financeiro

Marcelo Blay

Quando buscamos uma resposta para entender por que o brasileiro ainda estranha o mundo dos seguros, surgem algumas ideias. Esse comportamento teria algo a ver com a educação fundamental nas escolas? Existe algo que possa ser feito? Será que estamos deixando de fazer alguma coisa ou de melhorar algum ensinamento para que nossas crianças aprendam desde cedo a importância da precaução e visualizem melhor as vantagens de se programarem financeiramente para sua vida adulta? As pessoas poderiam perceber desde cedo a importância de proteger aquilo que conquistaram.
Muito se discute sobre as condições da educação brasileira, especialmente a de base. Nessas horas, é fácil fazer críticas vazias, sem reconhecer que, em vários aspectos, a direção da mudança tem sido positiva. Além disso, apontar as falhas sem oferecer uma solução jamais fará o Brasil atingir o que acreditamos ser nosso potencial como nação em um horizonte de curto prazo – e, com isso, quero dizer uma geração, algo próximo a 20 anos. Se demorarmos mais tempo, poderá ser tarde demais para o país, uma vez que o chamado bônus demográfico de nossa população se encaminha para o fim, em outras palavras, o Brasil corre o sério risco de se tornar “idoso” antes de se tornar rico.
Mas é fato que algo deve ser feito para que nossas crianças, desde pequenas, tenham sua curiosidade despertada para o futuro e os riscos a que estamos sujeitos, pois todos acabamos vivenciando no decorrer da vida situações diferentes das desejadas. Neste ponto, cabe refletir com base em outros casos: uma cultura juvenil como a norte-americana, na qual o conceito de seguros e sua importância são mais bem compreendidos, poderia ser estimulada no Brasil?
Certamente, análises estatísticas mais aprofundadas não fazem parte do currículo do ensino fundamental, mesmo nas nações mais desenvolvidas. Mas algo de diferente é percebido em outros países quando vemos o gosto das crianças por esportes, seus times e jogadores. Nos EUA, por exemplo, um jogo de beisebol mostra, a cada lance, antes de uma rebatida importante, estatísticas relevantes com informações que impressionam. Esses dados não são complexos. Pelo contrário, ajudam a criança a construir suas próprias estimativas intuitivamente e, sem perceber, entender quais as chances de seu jogador favorito rebater corretamente a bola e qual o risco de o adversário ganhar pontos importantes para o time. No basquete, a mesma coisa: em vários momentos do jogo, números são fornecidos e estimulam a criança a familiarizar-se com contas básicas, frações e o tal do percentual.
Fica claro que, mesmo que esses pequenos não se tornem engenheiros ou mestres em alguma ciência exata, estarão aptos a fazer um planejamento financeiro e a trabalhar com o conceito de juros. Além disso, saberão o que esperar de um “lance” ou de uma “jogada” importante em sua vida pessoal – como a compra de um automóvel ou de sua residência. É aí que o hábito de pensar sobre o futuro começa a ser elaborado. A criança conseguirá estimar riscos, o que nada mais é que perceber a possibilidade de algo não sair como foi planejado, seja um gol de seu time, seja a cesta de três pontos do adversário, seja, mais tarde, seu carro ser roubado e ela perder o investimento de anos de trabalho.
Resta a pergunta: o que podemos fazer no Brasil, com nossos recursos escassos e com uma educação que ainda tem um caminho longo a percorrer? Por que não introduzir no currículo de alunos das primeiras séries estratégias educacionais divertidas, utilizando esportes como o futebol e o vôlei? Poderíamos abordar temas como o percentual de passes de um jogador durante uma partida, a quantidade de defesas de pênalti de um goleiro em toda a sua carreira ou o percentual de contra-ataques iniciados na defesa por um time que chegam a gol. Essas e muitas outras são situações que indicam para as crianças estimativas rápidas sobre a probabilidade de algo sair como o desejado ou como o indesejado.
Alguém poderia argumentar que o futebol atingiria apenas meninos, mas mudanças do tipo que propomos raramente escolhem gênero, raça e opção sexual. Poderiam exercer alguma influência no nível social e educacional, mas, justamente por isso, sugerimos aqui o esporte como foco de aprendizado. Também poderiam ser as redes sociais, que, como os jogos, são manifestações que abrangem, praticamente, do mais rico ao mais pobre. Se considerarmos o Brasil de hoje, no qual a inclusão digital é crescente, ficará ainda mais fácil.
Adolescentes e jovens, por exemplo, poderiam aprender noções de seguro por meio dos relacionamentos estabelecidos nas mídias sociais: quantos de seus posts receberam um “curtir”, qual o percentual de amigos que comentaram ou marcaram suas fotos. A ideia é que as mudanças venham não somente de uma aula específica, na qual um professor utilize o vídeo de um jogo e forneça estatísticas relevantes mas, também, da educação e dos hábitos cultivados dentro de casa.
Quando chegarem à idade adulta, essas crianças e jovens terão um bom embasamento para ponderar, por exemplo, se vale a pena investir 5% do valor total de um automóvel para fazer um seguro, se ele custou o equivalente a 20 salários para ser adquirido. A clareza no raciocínio para avaliar chances de um resultado acontecer poderá fazer com que a cultura do brasileiro se direcione mais rapidamente para uma cultura que valorize o planejamento pessoal e financeiro, atribuindo o valor correto a uma apólice de seguro que, muitas vezes, consideramos “cara” por simplesmente não termos parado para planejar o futuro ou estimar riscos.
Tenho certeza de que professores criativos terão outras ideias divertidas para ensinar uma disciplina que, quebrados os preconceitos, pode ser muito interessante. Talvez possamos contar com a ajuda das redes de TV que transmitem esportes para ampliar a quantidade e a qualidade das informações divulgadas durante as partidas. Esse pode ser um bom começo. Pelo menos, o assunto passaria a fazer parte das conversas nas escolas na segunda-feira.
* Marcelo Blay,  fundador e sócio-diretor da Minuto Seguros, está no mercado há mais de 20 anos e é formado em engenharia pela Escola de Engenharia Mauá com MBA em Finanças pela FGV e Columbia University (NY)..

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